Quem disse que você não pode errar? Quem disse que precisa ser perfeito?
Quando tentou dar seus primeiros passos, você caiu, talvez tenha se machucado, chorado. Mas, de alguma maneira, superou e não deixou que essa “imperfeição” de cair (erro ou aprendizado?) o paralisasse. De alguma forma você venceu e andou. E assim foi em diversas situações. Afinal, se nunca tivesse errado (cair é mesmo um erro?) e aprendido, estaria no colo da mamãe até hoje, não é mesmo?
Culpa, vergonha, medo de punição e temor do fracasso são altamente invalidantes. Mas, a partir de qual momento foi decretado que você não poderia mais errar? E, se foi decretado, você não é o(a) prefeito(a) aí da sua “cidade interior”, não pode revogar isso? Em que foi que você andou acreditando, heim?
O Google afirma que a população mundial é de cerca de 8 bilhões: oito bi de pessoas imperfeitas, acertando e errando vida afora. E… e só você tem a obrigação de ser perfeito? Só você é “condenado(a)” à perfeição? Sim, “condenado”, pois é uma prisão se dispor a essa missão impossível. Ou você acha que todas as outras pessoas vivem a vida ideal, “à la famílias-margarina” e não erram? E que será o fim do mundo se/quando descobrirem que você é, tão somente, “você mesmo, uai”?
Você é, eu sou, vós sois, nós somos todos imperfeitos: erramos. E que bom, somos humanos, uffffa!!! Essa vulnerabilidade nos une, nos faz ver que estamos no mesmo barco, que não precisamos sofrer sozinhos por padrões torturantes, de tão elevados! É muito pesado tudo isso, pare tudo! Será que você não pode ter mais autocompaixão (aliás, você a pratica ou é seu mais cruel inimigo?) e se cobrar menos? Acaso você acredita que não será digno de amor caso erre? Que se for visto como alguém imperfeito poderá ser abandonado ou rejeitado? Quanto custa entender que é merecedor(a) de uma trégua, ao menos?
Embora trágico, é muito frequente na cultura que tenhamos sido “educados” com mais rigor, ridicularização ou intolerância (essas são formas de violência, de agressão, sutis ou diretas) por não corresponder ao que os cuidadores desejavam. Talvez daí boa parte da vergonha, da culpa, dos medos, da crença de que todo erro será punido, da pressão por desempenho, das obsessões pela perfeição, como se humanos fossem heróis ou deuses. É o cenário propício para o “excelente” cultivo da rigidez, da inflexibilidade cognitiva, que de tantas formas destrói a saúde mental. E, da tentativa de “ser perfeito”, de manter padrões sempre rígidos e muito elevados, vem também a frustração, pois você sente que nunca foi suficiente, não é? Bem, nada mais imperfeito do que tentar ser perfeito. É o jeito certo de fazer errado, é um fardo pesado demais. Repetindo: pesado, desnecessário e “perfeito” somente quanto a consequências negativas, como prejuízos nos relacionamentos, no agravamento de estresse, Burnout e vários transtornos mentais possíveis.
Também acontece muito que a “educação” não tenha se dado pelo afeto e proteção, mas, sim, pela obediência a hierarquias, alimentando a ditadura do desempenho: “tenho que, senão…”
De qualquer forma: “e agora, José (ou Maria)”? Foi assim. Você se descobriu desta forma certo dia. E pode já ter percebido os prejuízos desta armadilha que o(a) acompanha desde cedo.
É aí que Vida lhe abre outra Oportunidade: a partir de agora, o que você quer fazer, o que de fato fará com esse excesso de críticas que internalizou? Sim, foi criticado(a) e hoje se tornou seu maior crítico(a). Concorda? Quer se manter apegado a esses padrões de tortura contra si mesmo ou quer se libertar?
Aliás, esse medo de receber críticas por algo é bem insano, não é? Para você não ser criticado por algo uma vez, pode ser que fique dias e meses se autocriticando em intensidade muito maior. Não é incoerente isso?
Bem, talvez possamos mudar a palavra, de “errar” para “aprender”. Entender que faz parte do processo, que não ser o primeiro, ser menos do que perfeito…. é da Vida.
É bom seguir se restringindo? Deixando que seus medos, agora transformados em parâmetros de vida, o impeçam de viver ou de concluir uma atividade, de se relacionar bem com as pessoas? Ou será melhor aceitar que as situações não serão ideais? Que se o erro é inevitável, então, será mais produtivo você focar na lição e na oportunidade de crescimento que ele traz?
Liberte-se, pois! Dê mais leveza à sua Vida! “Ahh, mas aí não cumprirei minhas metas, meu desempenho vai cair!” Será? Por quê?Você acredita mesmo que se não estiver hipervigilante, com atenção máxima ao seu desempenho (profissional, pessoal, sexual, acadêmico, etc), então, não conseguirá seus objetivos? Será que se você estipular objetivos claros e firmes, colocar foco total nos momentos certos para produzir, usar métodos, estratégias e atitude, isso já não será suficiente para entregar seu produto ou serviço com grande qualidade? O termo “workaholic” até já tem seus ares pejorativos pelo que impede que descanse quando precisa de fato desligar, repor energias. Cuidado: estresse, Burnout, depressão, ansiedade, pânico e outras questões mentais e físicas caminham por esta esteira. A passos largos, heim!?
Será que você não alcançaria mais bem-estar (saúde, estabilidade, produtividade, cumprimento de metas) se se cobrasse um pouco menos? Só um pouquinho, vai: 10% menos, pode tentar assim?
E se colocasse na sua agenda um compromisso sagrado: “agora vou obrigatoriamente descansar, repor energias!” Estranho isso, não é mesmo? Mas sim, se o seu grau de exigência consigo mesmo e com os outros é alto demais, se você acelera o pensamento, rumina e não desliga nunca… se espontaneamente não tem acontecido o “descanso do(a) guerreiro(a)”, então, programe-se! Como um paciente me disse: “Um passo atrás para depois conseguir ir dois à frente!” Certo?
Ok, afinal, às vezes vale mais o feito do que o perfeito! A frase é imperfeita, mas válida para situações em que você “trava”, não produz o necessário por imaginar que não conseguirá produzir acima do necessário (hã?, sério isso?), com a qualidade altamente estimada, afim de não comprometer a sua imagem.
A armadilha está pronta para você: tentar ser perfeito, não poder errar, não poder ter desempenho inferior ao esperado e se decepcionar por não conseguir. Talvez você se coloque a atingir objetivos e graus de perfeição altos demais, exagerando na autocrítica. E é possível que também critique outras pessoas por não produzirem como você estipulou que elas devem produzir. “Não poder”, “ter que”, … … e assim se frustrar, se culpar, se envergonhar, viver insatisfeito(a).
Talvez em algum momento você tenha sido severamente advertido ou punido. Ou não tenha sido diretamente, mas, sim, alvo de invalidações sutis, com aquela agressividade velada da ironia, da chacota ou da piadinha que desvaloriza, despreza, diminui. É bom ter ciência disso, entender e aceitar o passado. É correto acolher, como adulto saudável, a criança ferida e magoada que você carrega pesadamente há tanto tempo. Abrace sua criança interior, explique a ela que todo cenário da sua vida já mudou, que já não precisa mais pensar agir daquela forma antiga e disfuncional.
A partir de certo ponto é necessário se questionar: precisa continuar insistindo nesses mesmos padrões? Será que os seus prejuízos já não estão sendo maiores do que os lucros? Você consegue manter alta performance continuadamente, por décadas a fio, sem dar ao corpo e à mente o direito humano de reposição da energia gasta tanto nas atividades quanto nas emoções que as envolvem?
Regras são necessárias. São parâmetros de vida pessoal ou coletiva. Mas, precisa ser desse tamanho? Quem disse que não existem outros caminhos para a excelência profissional, acadêmica e pessoal? Observe, por exemplo, o caminho de produtividade com bem-estar abaixo:
a) traçar um objetivo;
b) sem perfeccionismo, examinar objetivamente cada detalhe, mergulhar no processo e estipular estratégias;
c) acreditar, com otimismo, na possibilidade de atingí-lo, não por bel prazer, mas por saber que tem capacidade de agir e tem ou pode desenvolver habilidades, usar suas forças para entregar suas tarefas; e algo importante, mais do que redescobrir suas forças: acreditar nelas e conscientemente usá-las em cada atividade;
d) persistir, mesmo quando o mundo parece desabar;
e,) esforçar-se para cumprir seus objetivos;
A ideia é você ter sua dose de sacrifício, sim, dedicação, foco por tempo determinado, perseverança e disciplina para iniciar ou continuar a ação mesmo quando não estiver tão motivado assim. Mas não se permitir ficar sempre tenso por “ter que”, por “desempenhar”. Entender que seu descanso diário não diminui, mas, ao contrário, aumenta a sua saúde e a sua produtividade.
Trata-se de você assumir erros e fracassos como partes do processo, sem culpa. Ainda assim você se esforçará, sim, e muito. E por isso suas chances de sucesso serão grandes, mas, veja, sem a necessidade de que isso seja feito por tanta pressão interna por conseguir um resultado. Que tal flexibilizar um pouco?
Obs.: Essa reflexão não substitui a psicoterapia.
Psicólogo Pascoal Zani
CRP 08/04471
@psicologopascoalzanihttps://www.instagram.com/psicologopascoalzani/
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Essa reflexão não substitui a psicoterapia.
Psicólogo Pascoal Zani
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